terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Totemismo


TOTEMISMO


            O totemismo eclodiu nos primórdios da humanidade numa época em que a mente humana despertava para valores espirituais mais elevados. Pela extrema proximidade com o mundo animal, o homem formou uma sólida aliança religiosa e contemplativa, através da  zoolatria. A partir desse culto sagrado e de uma certa forma vital para o homem daquela época, começaram a surgir entidades híbridas, resultantes da fusão das morfologias animal e humana, conhecidos como os seres mitológicos da antigüidade. A deusa irlandesa da guerra Morrigan, por exemplo, retrata bem o sentido desse pensamento, ela era(é) capaz de mudar a forma animal para a forma humana, sugerindo ainda as propriedades mágicas e sobrenaturais dos animais. A admiração e o respeito aos animais era tão grande na antigüidade, que no antigo Egito, o clero de Heliópolis instituiu que o leão possuía atributo de nobreza, desta maneira, nesse período os próprios faraós eram representados por estátuas de leões. Em razão disso, alguns arqueólogos apregoam que em virtude da desproporcionalidade de seu corpo a cabeça da Grande Esfinge, era inicialmente de leão, mas foi ressculpida num período posterior,  com o objetivo único de representar o faraó. Na Babilônia, o leão reaparece como o animal sagrado da deusa Isthar, deusa do amor e da fertilidade, imagens de leão adornam os portais de Ishtar na entrada da cidade.



No Templo de Salomão, segundo as próprias escrituras bíblicas haviam esculpidos “querubins e leões” (I Reis cap. 7, v.36), assim como “figuras de bois” circundavam todo o Altar do Templo (II Crônicas cap. 4, v.3).



A  Bíblia por seu turno, registra a influência egípcia do boi apis, por parte dos hebreus, ao considerarem o touro como a expressão mais completa da divindade sob a forma animal. Para os egípcios, os chifres representavam duas correntes de energia pisco-espiritual  que em geral emergem da cabeça de seres iluminados e que podem ser vistas por meio de clarividência e mesmo as vezes, fotografadas. O touro e o dragão podem terem sido escolhidos como objeto de culto simplesmente porque, tendo chifres possuíam também clarividência. O Velho Testamento, apresenta-nos diversas passagens que Iavé ou Jeová, aparece simbolizado ou mesmo adorado através do sacrifício de um touro, como podemos observar no Levítico cap. 4, v.5. Da mesma forma, identificamos nas figuras míticas dos assírios, denominadas Karibus, as quais possuíam corpo de touro, asas de águia e cabeça de homem e que tinham a função de guardiães, criando assim, o modelo para os Querubins, protetores da Arca da Aliança, descritos nas Escrituras.




 Os próprios dragões obedeceram a mesma idéia, possuindo garras de leão, asas de águia, e cauda de serpente, na Grécia eram consagrados a deusa Minerva, para mostrar que a verdadeira sabedoria nunca adormece. Na mitologia grega o cavalo de Perceu, chamado Pégaso, possuía asas de águia. Muitos personagens das histórias mitológicas da antigüidade e alguns deuses do paganismo, como o Minotauro, Centauro, os Ciclopes, os Faunos, as Harpias, as Medusas, o deus Horus, o deus Anubis, entre outros, personificaram e materializaram essa associação, ao tempo que deram aos teólogos da antigüidade, depois aos católicos naturalmente, os ingredientes necessários para a caracterização de um figura antagônica ao bem.




 Essas idéias não se consolidaram única e exclusivamente pela divinização dos animais, ou mesmo através da adoração de um  totem, foram também gerados e reforçados, diga-se de passagem,  pelas práticas sexuais zoofilistas, que muito embora fossem mais naturais no passado, esses distúrbios psíquicos, criaram a idéia no imaginário daqueles homens, que um indivíduo poderia nascer contendo uma parte humana e outra animal. Um exemplo disso, são os sátiros(Isaías cap.13, v 21 e cap. 34 vs 12 ;14)) parte homem, parte bode eram na realidade espíritos que habitavam os bosques e as montanhas da Grécia, seguidores de Dionísio, o deus do vinho, eram considerados dentro da mitologia grega filhos das ninfas com os bodes. Esses procedimentos equivocados, foram combatidos pela própria Bíblia, através de Moisés, no Levítico, cap.28, v.23, onde o legislador hebreu as condena desta forma: ”Não terás comércio com um animal, para não te contaminares com ele. Uma mulher não se prostituirá a um animal: isto é uma abominação”.




 Alguns animais no passado alcançaram grande destaque nesse mundo mágico e sobrenatural. Moisés, o grande legislador hebreu, recebendo essa influência, confeccionou uma serpente de Bronze, que foi adorada pelos israelitas como um deus.(Números cap.21, vs. 5 a 9). As serpentes como sabemos foram adoradas em todas as grandes civilizações antigas, desde a Índia ao Egito, chegando até as Américas, representando sempre o conhecimento e a reencarnação. A própria serpente do paraíso na verdade seria a representação desse ídolo, o “deus serpente”, largamente cultuado na Antigüidade, transfigurado como um ser maligno pelos teólogos hebreus. Desta forma,  touros, leões e serpentes, assim como outros animais dependendo do lugar e da cultura de cada povo, foram eleitos em quase todas as civilizações agrárias e pastoris no passado, como representação viva dos deuses na terra. O episódio bíblico, da adoração do bezerro de ouro, aos pés do Sinai, por parte do povo hebreu, ocorrido segundo as escrituras no momento em que Moisés recebia as tábuas da lei, mostra-nos sem sombras de dúvidas o ponto crítico da transição simbólica da aliança animal para a aliança divina. Abraão, Isaac e Jacó, já haviam firmado a aliança sagrada, mas o povo hebreu ainda ligado ao antigo sistema e automatismo, exercia a zoolatria, nesse caso, através da influência do culto egípcio do Boi Ápis, que simbolizava a força ,a virilidade e a fertilidade. O boi também representava o  deus Amonitas, Moloch, para o qual sacrificavam-se crianças por meio do fogo, era representado a exemplo do minotauro, como um homem com cabeça de touro.




 Essa integração homem-animal, percorreu séculos na Antigüidade, na mitologia romana também estão presentes através da história dos gêmeos Rômulo e Remo,  fundadores de Roma, segundo a mitologia,  filhos de Réia, os quais, foram abandonados recém nascidos, perto do rio Tibre, e salvos por uma loba que os amamentou. Nas civilizações pré-colombianas, como os Toltecas, os Maias, os Incas, os Astecas, não foi de forma diferente, os animais eram deudificados e cultuados pelos sarcedotes, chamados xamâs, os quais atribuíam propriedades mágicas, curadoras e sobrenaturais. Os animais, nessas sociedades atuavam como mediadores, cooperantes e guias da alma no mundo dos espíritos.



            Observamos então, que algumas prescrições antigas com relação à ingestão de carne de alguns animais não estão  ligados meramente a preceitos de higiene, o mais provável, é que estas práticas e advertências estariam ligadas a cultos ancestrais; um totem por exemplo, que significa a expressão símbolo dos valores e das realidades sobrenaturais. Animais considerados como sagrados, teriam ancestralmente a garantia de preservação, promulgada pelos sacerdotes ou Xamâs, classe dirigente de religiosos, detentores de uma capacidade intelectual superior, criaram leis severas contra aqueles que a desobedecessem, pois mantinham uma relação muito estreita com os animais que acreditavam serem mágicos e por intermédio deles diziam operar inúmeras curas, adivinhações e prodígios. Além do mais muitos acreditavam serem esses animais a encarnação viva dos deuses na terra. Portanto, o hábito de comer pescado às sextas feiras que muitos católicos ainda cultuam, por exemplo, não é apanágio dos cristãos como naturalmente se pensa, mas encontra-se atrelado a preceitos judeus seculares, que por sua vez, são muito anteriores a época de Cristo. Este hábito é na realidade resquício de um velho e antigo totem sírio, ou seja, um “deus” que teria a forma de um peixe. A própria idéia da ingestão de Deus, ritualizado pela Igreja Católica, através da eucaristia, na qual o corpo de Cristo é representado pela hóstia e o sangue pelo vinho, nos remete aos cultos ancestrais e primitivos da chamada teofagia, que consistia na ingestão de animais supostamente divinizados em rituais, através de exaustivas cerimônias, nas quais acreditavam absorver as propriedades divinas dos irracionais. Procedimento similar, também acontecia em muitas sociedades primitivas com os próprios seres humanos, quando após a  morte dos grandes guerreiros, seus companheiros alimentavam-se de suas carnes e vísceras, objetivando adquirir os seus mais sublimes predicados. Verificamos ainda hoje, na Índia não somente vestígios do totemismo, mais ele propriamente dito, em vários locais desse imenso e enigmático país, observamos a veneração de muitos animais como vacas, ratos, serpentes, macacos, elefantes, em muitas regiões distintas são adorados e cultuados como a encarnação de deuses ancestrais. Estes são devidamente alimentados pelos crentes, vivendo sem ser molestados em grandes templos, esperando que sua morte aconteça de forma natural, pois a ingestão da carne desses animais configura-se em crime inafiançável para os infratores. Podemos observar que parte das estruturas mitológicas e religiosas mais antigas relacionadas a prescrições alimentares estão de certa forma associadas ao mundo animal. O próprio cristianismo adotou as idéias ancestrais do totemismo, representando Jesus por um cordeiro, ou como um peixe, ícone que simbolizou o cristianismo dos primeiros séculos, ou uma pomba, símbolo que  identifica o Espírito Santo, segundo os preceitos das Igrejas católicas e protestantes. Interessante observar que no catolicismo a partir do século V, os mosaicos das basílicas de Roma ou de Ravena, passaram a representar e associar os evangelistas a figura de animais, esse pretenso simbolismo nada foi do que uma nítida herança do totemismo ancestral. O evangelista Marcos é identificado como um leão, Lucas a um touro, João a uma águia e Mateus a um homem. Na visão hindu alguns dos avatares ou reencarnações do deus Vishnu na Terra são representados por animais; Kurma ® Tartaruga; Matsya ® Peixe;   Narasimha ® Homem Leão; Varaha ® Javali. Abaixo, a título de exemplo, apresentamos alguns dos deuses egípcios e suas devidas correspondências animais, muito  embora no Egito, já se praticasse uma forma mais evoluída desse culto, eles traduzem bem, a guisa de exemplo,  o pensamento praticado desde a mais remota antigüidade.

EGITO
DIVINDADE
ANIMAL
ATRIBUTO
ANÚBIS
CHACAL
DEUS DOS TÚMULOS
BASTET
GATA
DEUSA DOS PODERES  DO SOL
DEUS-RÁ
FALCÃO
DEUS SUPREMO
HATOR
VACA
DEUSA DO AMOR
HEQUET
DEUSA DA CRIAÇÃO/ NASCIMENTO
SEBEK
CROCODILO
SERVIDOR DO DEUS SETH
SEKHMET
LEOA
DEUSA DA GUERRA
SETH
BODE/CACHORRO
DEUS DO MAL
THOT
BABUÍNO
DEUS DA ESCRITA
TUERIS
HIPOPÓTAMO
DEUSA  DAS GRÁVIDAS

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